Prezados deputados estaduais do RS,
Está em votação na Assembleia
Legislativa do RS um projeto de lei, LEI Nº 367/2013, de autoria do deputado
estadual Paulo Odone, que obriga a utilização de rótulo de “TESTADO EM ANIMAIS”
em produtos de higiene pessoal ou de limpeza fabricados no RS, bem como da
matéria prima de produtos aqui comercializada.
Neste contato escrevemos aos
deputados em nome de pessoas que solicitam urgente aprovação deste projeto
apresentando alguns argumentos para apreciação de vossas excelências[1].
Em primeiro lugar é preciso tecer
considerações acerca da grande mudança cultural que propiciou a demanda deste
tipo de rótulo. Os preceitos jurídicos são reflexos da sociedade e não o contrário,
assim à medida que a sociedade se modifica, modifica-se também sua legislação e
há um crescente apelo contra a crueldade animal. Até algumas décadas, estava naturalizada
em nossa sociedade a ideia de que podíamos usar os animais a nosso bel prazer,
mas isto tem mudando aceleradamente nos últimos anos e estas mudanças estão materializando-se
na legislação. Desde a primeira norma jurídica que deu proteção aos animais em
1945 com um decreto de Getúlio Vargas, nossa legislação tem refletido esta
tendência cada vez mais e na Constituição Federal de 1988 a crueldade com
animais passa a ser proibida e mais tarde é considerada crime. Atualmente está
em fase final de aprovação uma mudança na direção de maior rigor punitivo ao
crime de crueldade com animais no Novo Código Penal. Tanto é verdade que seria
exaustivo colocar aqui outras inúmeras normas que têm sido aprovadas em âmbito
federal, estadual e municipal propondo cada vez menos crueldade com os animais
e mesmo a proibição definitiva do uso de animais em várias situações já
materializadas em lei.
Estes argumentos partem principalmente
de um viés sociológico, porque não é preciso argumentar sobre o prisma da
legislação brasileira que coibir o sofrimento de animais já faz parte da
Constituição Federal, assim como o direito dos consumidores de terem acesso a
informações sobre produtos não só é ponto pacífico em termos jurídicos como faz
parte dos princípios constitucionais no que diz respeito à defesa do consumidor
há bastante tempo. Tanto é assim que o próprio CDC sublinha este direito à informação:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
III
- a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade,
tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.
Ou
seja, não estamos solicitando algo que não esteja já previsto na CF. Também
poderíamos acrescentar que a Constituição Federal nos agracia com o direito à Objeção
de Consciência que não nos é dado exercer, porque sequer temos o direito de saber
a origem da matéria prima que consumimos. E em nossa consciência optamos por não
consumir produtos que tenham colaborado com a crueldade de animais.
XIV - é
assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte,
quando necessário ao exercício profissional;
O que pedimos é apenas uma informação nos produtos. Não
pedimos quebra de sigilo profissional, nem acesso a informações privilegiados,
apenas queremos ter o direito a saber o que nos é oferecido para consumo para
termos direito à escolha e à informação.
Mas o mais importante
a trazer para reflexão é sobre a grande mudança cultural relacionada a este
projeto de lei. Pesquisas apontam um crescimento exponencial de pessoas que se
recusam a consumir produtos que tenham contribuído com o sofrimento e
exploração animal e é preciso acompanhar esta tendência cultural na legislação
e construir um mercado de acordo com esta demanda. Sabemos que uma mudança cultural traz
resistência de alguns setores da sociedade e compreendemos as dificuldades
práticas desta mudança, mas é preciso avaliar para quem é feita a legislação.
Os produtos são feitos para os consumidores e como vivemos num Estado
Democrático de Direito, as empresas precisam atender as normas de produção de
produtos para atender aos consumidores e neste caso os empresários são a
minoria que lucra com estes produtos e cabe a eles mudarem de acordo com a
legislação para atenderem a maioria, para quem são feitas as normas de defesa
de comercialização e os produtos. Não cabe a nós mudarmos conforme a oferta;
cabe a eles criarem a oferta conforme a demanda e neste caso a demanda
reprimida de uma legislação que atenda este público é significativa. Esta legislação já está atrasada em termos
culturais e mesmo legal, porque é de 1988 que se fala em direito do consumidor
como um dos direito humanos a ser observado em nosso país e da necessidade de
transparência dos produtos. Este projeto também está atrasado se considerarmos
a aceleração desta mudança cultural e a mudança em outros países.
Não podemos mais ser considerados uma ameaça de consumo para
este setor; é preciso sermos considerados uma fatia crescente de mercado que
exige transparência dos produtos e nos permitirem escolher não consumir
produtos que tenham colaborado com a crueldade com animais. Cabe observar que mesmo que esta lei não seja aprovada, os empresários descontentes não
poderão deter a mudança cultural que exige produtos com rótulos sobre testes em
animais, porque já existem empresas lucrando sem resistência com este novo
mercado ao mesmo tempo em que atendem à legislação que impõe mais transparência
sobre a matéria prima e conteúdo dos produtos.
Aprovar esta lei também auxilia que estas empresas mais
resistentes a se adaptarem às mudanças culturais prevenindo prejuízos no
futuro, caso persistam em não atender ao mercado que emerge com uma nova
demanda. Cada vez mais pessoas procuram empresas que não testam em animais e no
caso de cosméticos e saneantes há já várias opções. É preciso possibilitar
conhecermos mais empresas e a possibilidade de consumirmos produtos de empresas
gaúchas que poderiam se adequar a este perfil de consumo. Hoje conhecemos as
grandes corporações internacionais, algumas das quais já colocam inclusive
rótulos de “testado em animais” e outras preocupadas em informar as origens da matéria
prima de forma transparente e responsável.
Hoje em dia a proibição de testes em animais em cosméticos e
saneantes (material de limpeza) está alcançando vários países e mesmo em São
Paulo há projeto semelhante e aprovar este tipo de legislação ajudaria estas
empresas a venderem seus produtos tanto no RS como em outros mercados mais
exigentes, porque na Europa se exigem igualmente informações da matéria prima e
insumos dos produtos.
Repetimos que podemos entender das dificuldades práticas de
modificarem esta conduta para algumas empresas que inclusive nem testam em
animais, mas isto na realidade trará mais consequências positivas do que o
investimento inicial em criar novos rótulos nos produtos a serem
comercializados. Também gerará mais empregos, para criar setores de pessoas
responsáveis em buscar informações sobre a matéria prima dos produtos, e poderá
criar novas empresas que tratem destas informações, além de favorecer a criar a
cultura da transparência da matéria prima no RS e no Brasil! Isto sem falar que propiciará a inovação no
uso de métodos substitutivos aos animais sem esquecer que o uso de animais não
é obrigatório para estas substâncias e na realidade há entendimentos de que
quando houver alternativas com métodos substitutivos estes métodos deveriam ser
utilizados. Ao criar este rótulo no RS estaremos dando oportunidade a estas
empresas a se adequarem para novos mercados, quem sabe, de forma inovadora em
relação a outros mercados, para além do estado e do país.
Também sendo um ano eleitoral, não podemos deixar de falar
das mudanças culturais e da demanda de políticas públicas que atendam este público
crescente que exige o fim da crueldade para com animais e parlamentares que
acompanhem esta mudança, por isto pedimos que não resistam às mudanças e
atendam à vontade da maioria.
Mesmo que os ativistas da causa de defesa de animais não seja
a maioria o número de pessoas que aprova o fim do uso de animais é maioria,
tanto é que conseguimos derrubar um importante instituto que realizava testes
em animais no ano passado, o Instituto Royal, em São Paulo, bem como o
presidente do CONCEA em exercício naquele período.
Escutem o que estes eleitores pedem, e acompanhem a mudança
que pede transparência e o fim da crueldade para com animais.
Muito mais poderia ser dito a este respeito, mas neste
momento apenas convidamos a refletirem sobre uma nova ordem social que se
constrói para que seja construída uma nova ordem jurídica que nos garanta a
transparência nos produtos ao mesmo tempo em que permite o fim da crueldade com
animais.
A seguir apontamos alguns argumentos para a aprovação deste
projeto:
1-existem cada vez mais consumidores que não usam produtos
testados em animais e este número cresce exponencialmente e em breve seremos
maioria;
2-este projeto está de acordo com vários artigos da
constituição que tratam da defesa do consumidor, e a necessidade de transparência,
do direito à objeção de consciência e do direito de todos a viverem num
ambiente ecologicamente equilibrado e o uso de animais em testes não pode ser
considerado ecológico;
3-um rótulo de indicação de testes em animais auxilia as
empresas a se adequarem a estas mudanças culturais impedindo que tenham
prejuízo no futuro, favorecendo condições de competição com grandes corporações
que já fazem indicação em rótulos ou que aboliram testes em animais;
4-a EU proíbe testes em animais para cosméticos e material de
limpeza e esta tendência tem se espalhado globalmente e o que queremos neste PL
é apenas um rótulo!
5-a CF proíbe a crueldade com animais e o uso de animais em
testes é cruel e não é de uso obrigatório em cosméticos e saneantes, segundo a
legislação atual e indicar o uso de animais ajuda a coibir o uso cruel de
animais favorecendo o uso de métodos alternativos.
6-mesmo que algumas empresas peçam que a ausência de rótulos
se mantenha somos em franca maioria em relação a uma minoria de empresários e
cabe ao poder público atender a esta maioria que demanda novos produtos, mais
do que a uma minoria que não quer ter despesas que seriam necessárias apenas
num primeiro momento, sem falar que estas mudanças atendem à própria Constituição
Federal;
7-os produtos com rótulos com maior transparência teriam
maior penetração no mercado fora do RS e seriam mais bem recebidos por mais
pessoas;
8-mesmo que a maioria das pessoas não seja ativista de defesa
de animais a maioria das pessoas se importa com animais e preferirá sempre
produtos que indicam se os produtos a serem consumido colaboraram com a
crueldade e exploração animal e cabe aos parlamentares eleitos pelo povo
atenderem a estas demandas;
9- não podemos deixar de dizer que mesmo que algumas empresas
auxiliem a financiar campanhas dos parlamentares, não serão elas que trarão os
votos, por mais publicidade que ajudem a produzir. No futuro, inclusive, a
legislação de arrecadação de fundos para campanhas poderá mudar e estas
empresas não poderão mais colaborar em campanhas, mas os eleitores vão continuar
votando a partir de seus interesses ideológicos. A causa animal tem
características diversas de várias outras bandeiras e pessoas que se importam
com animais guardam longa memória compartilhada em rede de quem favorece os
animais por muitas legislaturas!
10-cabe às empresas
adequarem-se às mudanças de mercado e não exigirem uma inércia cultural e legal
da sociedade. Os consumidores não vão mudar, eles já estão mudando no sentido
dos termos deste projeto, cabe aos empresários atenderem as necessidades de consumo
dos consumidores;
11-vivemos numa
sociedade em rede, conectada em tempo real e esta é uma causa de todos os
ativistas de defesa dos animais de todo o país que compartilharão esta inovação
legal pelo Brasil, seus apoiadores e aqueles que resistirem a mudar, sejam
parlamentares ou empresas;
Concluo com palavras que serviram de argumento para outro
projeto relacionado à questão.
“Entendemos que para algumas pessoas estas mudanças e ideias
são difíceis de serem aceitas e para alguns acarretam mesmo prejuízo cultural,
se não econômico, mas não há decreto que impeça que a cultura se transforme,
principalmente esta que cada vez mais cria raízes em todos os lugares. Não há
decreto que impeça a transformação social, ao contrário, a resistência
fortalece o movimento, pois favorece mais ainda a união e a consciência sobre
as questões defendidas. As resistências às mudanças sociais têm efeito
contraproducente e produzem muito mais aceleração na direção das mudanças. (...)
A tendência é que cada vez mais pessoas que comunguem dessas ideias ocupem
vários setores da sociedade e busquem a materialização destas mudanças nas mais
diferentes formas e setores da sociedade, seja através de campanhas, de
manifestos, de boicotes, nas suas atividades profissionais e mesmo na política,
pois mesmo parlamentares têm sido eleitos somente porque se preocupam com os
animais, assim como outros têm deixado o cenário político por apresentarem
projetos que regularizam ou permitem a exploração dos animais.”( retirado deste link)
Eliane Carmanim Lima, Porto Alegre 4 de agosto de 2014.
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