Artigo relacionado a uma palestra por mim proferida para orientadores educacionais em evento organizado pela AOERGS.
De tempos em tempos a sociedade engendra novos paradigmas culturais. Assim emergiu o ideário abolicionista que entendia que não deveriam existir escravos, depois veio o ideário feminista que pregava direitos iguais a homens e mulheres. Mesmo que a assimilação de novos valores não se dê de forma uniforme na sociedade e que ainda existam grupos que resistam a estes valores de respeito e igual dignidade, os novos paradigmas se impõem aos antigos e passam a ser dominantes. É desta forma que o racismo e sexismo são rejeitados culturalmente, mas houve um tempo em que teorias sustentavam o preconceito e a exclusão social, mesmo nos meios acadêmicos. Esta assimilação de novos conceitos e valores legitima e passa a ser legitimada na Escola e na Universidade. Até que estes valores não ganhem legitimidade científica que é a força que garante o status de verdade de um saber eles são rejeitados nos centros acadêmicos.
Hoje estamos vivendo a emergência de um novo paradigma cultural que é a questão ambiental e neste campo a ideia de um respeito à natureza e mesmo aos animais. Mas ainda estamos vivendo o momento de resistência dos meios oficiais para acolherem estes novos conceitos que surgem na sociedade. Esta temática desponta no terreno jurídico, político e econômico como consequência desta mudança cultural. E este é o curso normal das transformações sociais. Primeiro o paradigma emerge na sociedade com uma demanda de mudança de conduta e visão de mundo. Quando um novo conceito emerge, criam-se palavras e expressões que dão conta desta nova visão e a demanda de uma nova forma de atuar no mundo. Em outros tempos criamos ou produzimos novos sentidos às palavras: feminismo, racismo, exclusão, respeito às diferenças, homoafetivo, etc. Hoje circula a noção de “desenvolvimento sustentável” apontando uma nova conduta do ser humano em relação à natureza, mesmo que a expressão em si sustente ainda a forma antiga de exploração e esgotamento da natureza, porque o valor dado ao desenvolvimento se impõe à ideia de preservação e respeito. Da mesma forma surge outra demanda de respeito aos animais. Esta mudança de paradigma para com os (demais) animais e mesmo para com a natureza já começa a se cristalizar na legislação que sempre acompanha as mudanças sociais. Na Bolívia e Equador animais e natureza passam a serem sujeitos de direito, o que significa o direito, não somente de preservação, mas da defesa no sistema judiciário, como só ocorre com os humanos. O mais significativo é que nesta mudança o que muda é o foco de um antropocentrismo que remonta a Idade Antiga para um “biocentrismo” que seria o respeito aos animais por um valor intrínseco. E já começa a surgir uma nova expressão que ainda não chegou ao senso comum, que é “especismo” e “anti-especismo”, expressando a nova ideia de libertação também dos animais como foi antes dos negros, das mulheres e de outras minorias. Aqui eu arrisco dizer que estamos não somente diante de uma mudança cultural, mas de uma revolução. Assim como a Revolução Copernicana deu conta de tirar a Terra do centro do universo, agora damos conta de tirar a espécie humana do centro de nossas ações. Mesmo no Brasil este movimento é claramente percebido com novas leis, movimentos de defesa de animais, manifestos e mesmo uma mudança no consumo é percebida.
Mesmo que o papel do educador não seja o de impor valores éticos cabe a ele acompanhar as mudanças sociais, para compreender este momento e estes novos alunos que chegam à Escola. O educador não pode ser o foco de resistência a estas mudanças nem a estes novos atores sociais que se apresentam no cenário escolar e estar aberto às novas demandas de “sustentabilidade”, respeito às diferenças, e à visão biocêntrica ou ecocêntrica em relação à natureza e demais animais. Assim como hoje a Escola se prepara para atender diferenças de forma a garantir a dignidade a todos, também cabe compreender estas mudanças de valores sociais e suas implicações na Escola e no mundo.
Eliane Carmanim Lima
Porto Alegre, 9 de maio de 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário